14 de abr. de 2011

Programa “Cantores Bons de Bico” - Divulgação científica e enfoque sócio-ambiental




Surgiu como um trabalho final da disciplina de rádio, ministrada pela Profa. Dra. Gisela Swetlana Ortriwano, do Departamento de Jornalismo e Editoração da ECA/USP, no Curso de Especialização em Divulgação Científica do Núcleo José Reis (NJR).

Chegou ao fim com quatorze meses de programação veiculada pela Rádio USP três vezes ao dia, às dez da manhã, às quatro da tarde e às duas da madrugada, rendendo uma boa resposta do público ouvinte.

Fórmula básica: utilização de músicas, descrição da ave e a veiculação do seu canto.



Entrevista com Ricardo Gandara Crede – Mestre em tecnologia nuclear, biólogo, com formação em marketing e especialista em divulgação científica


Público
O programa "Cantores Bons de Bico" despertou muito interesse dos ouvintes. Até recentemente eu recebia e-mails de pessoas querendo informações para a identificação de uma ou outra espécie de ave. Existem muitos apreciadores do canto das aves, grupos de ornitólogos amadores e observadores de aves. O Birdwatching é um "esporte" bastante popular em outros países e tem crescido muito no Brasil. O grande diferencial do programa de rádio é que usavamos a vocalização das aves para identificar as espécies. O que geralmente acontece é o uso de guias de campo, contendo ilustrações dos animais. Isso foi um diferencial do programa.

Nosso público era formado, além de universitários e acadêmicos, por muitas pessoas que relacionavam a rádio USP à educação e cultura. A rádio mantinha a posição de lanterninha da audiência na cidade de São Paulo, longe de um formato comercial, transmitia música popular brasileira (MPB) e tinha programação variada, mas sempre focada em atividades culturais e da vida acadêmica. Como o programa era veiculado 3 vezes ao dia, em rápidas inserções (formato de boletim radiofônico), pegávamos diferentes ouvintes, no período da manhã, tarde e início da madrugada.

Dificuldade X Estratégias
A maior estava no curto tempo para pesquisar músicas e relacioná-las às diversas espécies de aves. A idéia era trabalhar com músicas que fizessem referência ao animal, isso era muito complicado. Muitos programas foram feitos fora deste formato, mas era válido, estávamos numa rádio universitária. Prezávamos pela inovação ! Chegamos a montar um programa sobre frangos, usando como trilha sonora uma galinha cantando rock. Em um outro, especial de sete de setembro, não havia texto, inserimos apenas uma gravação do hino nacional, acompanhado pelo canto de diversas aves brasileiras.

Muitas eram as estratégias para desenvolver o interesse dos ouvintes. A própria música cumpria esse papel, quebrando o gelo e aproximando o texto mais técnico a questões do dia a dia e do emocional do ouvinte. Referência a personagens de desenho animado, ou a aves que aparecem em músicas ou hinos também eram feitas.

Oportunidades
O programa "Cantores Bons de Bico" foi criado no período em que eu estava no mestrado. Fiz a produção dos programas e a rádio USP ficou responsável por sua veiculação. Programas como este devem sem dúvida serem apresentados a empresas para possíveis patrocínios. É viável a divulgação científica como forma de marketing. No caso deste programa, a veiculação poderia ocorrer numa rádio comercial, com patrocínio de uma fábrica de rações. Ou ainda ser veiculado internamente em lojas de uma grande rede de petshop. O programa Cantores Bons de Bico terminou, mas imagino que seria interessante um acerto de sua página na internet, que foi montada na época da criação do site da rádio USP e precisa ser atualizada. Existe a possibilidade, já está em andamento, de desenvolver outros produtos com o mesmo nome, a partir do programa de rádio. Muitos professores solicitaram cópias do programa para a utilização em aulas de educação ambiental. Tenho muitas idéias para o rádio, principalmente depois de ter estudado marketing. Acredito num novo formato de divulgação científica em que as atividades podem ser desenvolvidas junto a veículos de comunicação de massa e o apoio da iniciativa privada

 
Outros projetos
Desenvolvi um projeto biográfico montado para o rádio e intitulado "Santos Dumont no Ar". Infelizmente nunca foi executado, mas foi aprovado por uma comissão interministerial em Brasília que organizou o centenário da aviação no Brasil. Fui trabalhar na iniciativa privada logo após encaminhar o projeto. O formato como o projeto foi apresentado era muito inovador. Gerado como um vídeo, continha todas as informações necessárias as quais poderiam ser facilmente apresentadas a possíveis patrocinadores em poucos minutos. Utilizando ferramentas usadas pelas radionovelas "Santos Dumont no Ar" também previa a inserção da biografia do pai da aviação em outras situações de grande importância e vulto para a ciência da época, contextualizando a história. Pode ser adaptado ao formato de radio novela. Santos Dumont deixou muita coisa escrita, e alguns materiais como o livro “O que Eu Vi, o que Nós Veremos” forneceriam material para um programa que em alguns trechos poderia ser encenado, utilizando instrumentos de rádio novela, como a fala de personagens, sonoplastia com o som do motor dos dirigíveis ou do vento.

Surpresas
Tive um caso inusitado em relação a uma música usada no programa. A rádio recebia muitos CD´s e gravações de cantores ou grupos que estavam começando. Num destes materiais, um CD com cara de gravação independente, havia uma música que batia com a temática de um dos programas. Conversei com o pessoal da discoteca, usamos um trecho da música daquele CD que havia sido deixado na rádio a poucos meses. Dia seguinte a veiculação do programa com a música, recebemos uma ligação. Queriam conversar com o produtor do programa. Parecia que ia rolar algum problema com direitos autorais ou coisa assim. Mas chegando ao telefone a reclamação era outra: "Quero reclamar que em seis meses que o CD ficou aí, ele nunca foi usado, agora que vocês tocaram uma música dele, tocaram pela metade!". Foi algo que não esperávamos.

Os direitos autorais das músicas utilizadas no "Cantores Bons de Bico" ficaram por conta da Rádio USP. As músicas apresentadas eram anotadas, indicando-se o seu uso (programa, tempo de veiculação), sendo passado a uma funcionária da rádio responsável por acertar todas estas questões de direitos autorais. Já as gravações com o canto das aves eram conseguidas de várias fontes. E surgiu mais um caso inusitado neste sentido. Apresentando a proposta dos programas a um colega biólogo, especialista nesta área, comentei alguns exemplos de programas a serem desenvolvidos. Daí ele me questionou, que a vocalização de uma das espécies que eu havia mencionado, somente ele tinha. Achei estranho, pois tinha uma vocalização daquela espécie, será que minha gravação estava errada ? Mostrei a ele, e estava certo, era a gravação daquele animal que só ele tinha, pior, era a gravação dele ! Detalhe, a gravação havia sido publicada na internet e já estava circulando entre biólogos e interessados no canto das aves!

A gravação da vocalização de aves de diversas espécies é algo que circula muito entre os biólogos que trabalham nesta área. Hoje com o surgimento de aparelhos celulares mais sofisticados, é raro o especialista da área cujo celular não tem toques imitando o canto de alguma ave, ou que possua gravações para usar como chama em atividades de campo. O uso de gravações (play-back) é muito comum para o desenvolvimento de atividades como inventariamento da avifauna. Emitindo gravações do canto das aves (chama), o biólogo consegue atrair indivíduos da mesma espécie que possam habitar aquela região. Em alguns casos, os machos são tão territorialistas que eles voam para cima do aparelho de som, podendo ser capturados com certa facilidade utilizando-se esta técnica.

Dicas sobre financiamentos e parcerias  
Uma dica importante é a forma como você apresenta seu trabalho. Me lembro de como chamei a atenção quando levei este projeto a um congresso. Não apresentei um projeto, ganhei o público veiculando alguns programas montados especificamente para aquela atividade. Variações dos “Cantores Bons de Bico” também já foram utilizados em diversas ocasiões. Aprendi muito com isso, todos projetos seguintes que realizei ganharam uma apresentação rápida em formato auto-executável do Power Point, contendo músicas e imagens. Quanto ao formato rádio, uma dica para quem está começando é buscar um veículo que esteja aberto a novos projetos. Além disso, é sempre bom lembrar que programas rápidos, os chamados boletins radiofônicos contendo entre 3 e 5 minutos são de mais fácil veiculação. Um dos grandes problemas hoje, principalmente nas rádios comerciais é conseguir um espaço na grade de programação.


Para ouvir todos os programas: http://www.radio.usp.br/especial.php?id=3

Contato: Ricardo Crede rgcrede@hotmail.com